30 março 2014

Não existe diferença entre eu e você. Não existe diferença entre o que você pensa e o que eu penso. A diferença se é que existe, já que insiste, está no tempo das coisas. A diferença do tempo. Formaríamos um divertido casal. Uma boa dupla. Mas o tempo, esse animal arisco, escorrega entre as folhas do calendário. A sintonia fora do ar. A estação mais fria. Se agora não nos podemos. Ontem não tardará em voltar. Oferecemos tempo que noutra esquina, tão perto, ainda havemos de nos reencontrar.

Andy Gercker
30.03.2014
E pra tudo acabar em. No mais profundo e violento desejo. Selvageria. E por que não somos livres? Se tudo que se consome é pra esse fim?! Sou cria dessa cisma burra e careta. O comum seria na rua quando se precisasse. Posso ter um dia de escritor em casa sem culpa? Posso buscar tranquilidade para esse canto de dentro? Estamos atravessando a era do tédio. O tédio em seu trivial destino desfila por entre minha rua e depois circula a cidade inteira e sufoca a todos. Quero conhecer um ser humano ao menos que foi capaz de pensar a vida sem que tenha esbarrado com a tristeza. Fico nu em casa então. Em protesto solo. Aguardando notícias de outros mundos pelos aplicativos. Alguém há de querer entrar nesta dança. Aguardemos. Como sempre. Não adianta querer buscar sentido quando o sentido é o que menos se deseja. Fuma. Você não precisa ir para a rua. Você nesse momento não precisa. Aproveite. Correr para que? Comer por que? Sair para onde? Ah sim, pra acabar tudo em. Hoje dispenso. Preciso entender três coisas:

1.     onde foi mesmo que guardei todas aquelas sensações?
2.     quem avisou a policia que estou morto?
3.     do que eu lembro antes da patada do leão?




 Andy Gercker 
29.03.2014

Acidente 1

Andy e Ana ao telefone:

explodiu
o que?
o computador
onde?
na cara
de quem?
Jean
quando?
agora
como assim?
eu vi.
espera aí, o que está acontecendo?
tem pedaço dele em mim.
pedaço?
da cabeça eu acho.
que nojo.
pois é.
onde é?
aqui.
onde fica?
na frente.
do que? eu vou ficar doida.
da minha casa.
fala mais alto.
casa.
na frente da sua casa?
é.
Jean?
é.
não conheço.
meu namorado.
desde quando você tem namorado?
tinha.
desde quando você tinha namorado?
desde de sexta.
caralho.
agora a cabeça dele explodiu.
se isso for brincadeira eu vou ficar puta.
tem pedaço dele em mim. na minha boca.
cospe.
o que?
o pedaço dele.
pronto.
cuspiu?
cuspi.
ótimo. estou indo praí.
Ana.
que?
chama a policia.



Andy Gercker 
29.03.2014

17 março 2014

Quão fundo ainda pretende essa desenfreada agonia passear pelos azedos caminhos do delírio? E até onde suportará essa ânsia moribunda e triturada de recomeços? Já queimou e virou cinzas todo volume de esperanças. É do pó, a urtiga do que virá. Poderiam muito bem sair da minha frente esses selvagens tapetes de cordas pesadas pra acertarem outra cara. Mas me atravessou rasgando fundo a carne com aquela frase. No mais áspero desejo de não querer fazer sofrer. Mas é assim a vida. Comentou o alienado. Adeus agitação. Possível domador de fontes novas. Quão cansado ainda ficará o relógio? Dilacerante e banal como qualquer canto que se cante. Nas mãos suadas e bêbadas algumas respostas vacilantes experimentam recolocar a ordem dos pensamentos. Tem o impacto de uma descarga elétrica de alta intensidade e de longa distância. Que derruba. Que ofende. Que entristece. Adeus aquele plano. Adeus aquela idéia. Até talvez mais um domingo. Fissura desgastada pelo monótono exercício do destino. Um pássaro de asa quebrada que sabe reconhecer o sublime impulso de um voo saberá num momento importante voltar a ser valente. Em paz. Sem sofrimento. Para outra vez. Arde na bunda o peso do coice de um animal ideal. É possível acreditar que conseguirá recobrar a razão? Jamais. Que apaguem as luzes e se faça silêncio. Esta noite preciso chorar.


Andy Gercker
17.03.2014
Bairro Peixoto.
RJ





05 março 2014

Pronto, agora ele cismou que.

Passar a vida pensando para que serve a vida.
Passar a vida pensando.
E não sabe como fazer dinheiro do que pensa.
Não ganha para pensar.
Mas pensa.
Teimoso esse menino.

Pronto, agora ele cismou que.

Vai mudar as coisas de lugar.
Para encontrar um lugar.
Em que possa esconder.
As coisas fora do lugar.
Mas que teimoso esse menino, ele não vai encontrar.

Pronto, agora ele cismou.



Andy Gercker
04.03.2014
Bairro Peixoto
Copacabana
RJ 


Estou tomando banho no fim da tarde de uma quarta-feira de cinzas no meu quarto e janela de Copacabana, quando ouço o barulho da porta sendo aberta. Que isso? Quem está aí? Oi. Que mala é essa? Quer entrar? Que susto! Para que essa faca? Ai… Acabou.



Andy Gercker 
Bairro Peixoto
Copacabana
05.03.2014
RJ