17 maio 2009

PRECISO VER O MAR

Preciso ver o mar. Curioso pensar que o que mais me assusta é o que mais me acalma também. O mar. Como é misterioso o mar. Hoje me peguei com essa necessidade, essa falta, com esta saudade. E ela chegou assim inesperada num momento tão absolutamente impróprio, mas me veio assim: que preciso ver o mar. Mas tem que ser naqueles dias em que ninguém se interessa por ele. A praia precisa estar deserta. Tem que ser naquele horário quase de fim de tarde início da noite em que a cor do céu ainda está indefinida. Seria bom se esse momento congelasse. E ficasse assim naquela cor naquele horário sem ninguém e só silêncio.  Quem sabe assim, quem sabe eu olharia para dentro de mim. Tenho evitado isso. Antes era uma apenas uma impressão agora sei que existem muitos de mim em mim, dois com absoluta certeza. O eu eu e o eu eu eu. Entendeu? Eu explico: uma espécie de: o que sou e o que de fato sou. Ficou mais claro? Eu sei como sou, sei por que sou só não entendo por que não ouço e porque ignoro quem sou. Seria tão mais fácil, gastaria menos tempo viveria mais coisas. Esse outro eu do meu eu é diabólico, não no sentido negativo, mas na capacidade de criar artimanhas e me passar sempre uma grande rasteira. Às vezes um terceiro eu do eu eu assiste isso e prevê a cilada em que estou caindo a cilada que eu mesmo preparei para mim e nada faz para evitar mais um tombo. Esse terceiro é cruel. Descobri agora. Deve ser pelo fato de sentir-se menosprezado. Aqui dentro ele não tem muita importância já que o que conta mesmo são esses dois. Eu queria simplesmente ser apenas um e queria que fosse racional, objetivo certeiro, prático, independente, ousado e mais generoso. Mas não cabe em um só tudo isso daí que tenho ou temos, não sei, não conheço outro por dentro para afirmar, mas daí que existem inúmeros de mim em mim. A temperatura contribui muito para que algumas dessas carências se manifestem a generosidade, por exemplo, faz tempo que não a vejo, deve ser pelo frio. Não tenho sido generoso comigo com os outros os externos talvez. É sempre tudo tão móvel em transição percorrendo caminhos distintos a cada segundo, mesmo sabendo a direção tendo o mapa decorado, mas esse segundo eu atrapalha, insiste em perturbar. Pra resumir, é a minha consciência brigando com a minha carência. Um minuto. Ou é a minha carência brigando com a minha consciência? Estão vendo? Elas não se entendem. Atrapalham-me até para defini-las. É uma querendo receber algo tão abstrato que não se sabe o que é, e a outra sabendo disso e ainda permitindo que isso aconteça sempre. Duas tolas perdendo tempo e fazendo sofrer um todo. Individualismo é isso que me destrói. Tão simples e tão impossível. Esqueça quando disse logo acima que sei como sou e sei por que sou. Na verdade não sei. Assim como não sei quem está escrevendo. Me perdi. Só sei que preciso ver o mar. Mas tem que ser naquele horário naquela cor sem ninguém só essa casca com tantos de mim, dentro de mim, deitado na praia de braços abertos esperando a primeira onda para aos poucos ir levando-me para dentro do mar para que eu me afogue de verdade. Quero ser arrastado aos poucos, discretamente e em silêncio sumindo. Quero morrer no meu medo. No mar. Quero nascer de novo e quando nascer quero pouco, quase nada, modestamente quero apenas ser um e mais nada.

Andy Gercker

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